O texto a seguir comunga com a forma mais geral daquilo que defendemos anteriormente, ou seja, a coexistência do lugar e do espaço sem que exista subsunção senão temporal e, entendamos que; quer o tempo, quer o espaço, não fazem divisões rítmicas: são entidades não substanciais, sempre existirão em qualquer caso, qualquer que seja o problema apresentado.
São, assim, nas identidades e nas alteridades que participam a percepção individual do tempo e sua relação com o espaço. Visão cingida na conceituação cronológica. No entanto esse esquema relativamente linear pode se complicar ao se indagar a construção atual de identidade e de alteridade. Seguindo o pensamento deleuziano o lugar pode ser visto como espaço, como uma alteridade que se interioriza a identidade. Esta visão esquizofrênica se relaciona com o tempo como limite do pensamento e obriga o pensamento projetar-se além dos ideais da singularidade.
A alteridade do lugar coloca fora de si o próprio tempo, o tempo é o espaço de todo pensamento, de todo lugar, a forma pura e vazia. A compreensão do lugar como espaço eleva o campo problemático, toma de assalto os ideais inconscientes na fissura do lugar, roubado do pensamento pelo inconsciente, passa por uma etapa transitória, aparentemente mais tradicional, a saber, a relação com o espaço: O lugar é o espaço porque foi feito, reciprocamente, espaço por outros espaços.
Mas a interpretação revitalizada desta primeira etapa não é mais que uma mediação: a plataforma para uma nova superação de um espaço completamente diferente para outro. Como não é possível, então, encontrar uma identidade absoluta, tampouco e factível encontrar uma alteridade substancial e estável, sem que o alter ego se dissemine nos espaços. Os espaços podem ser: étnico e cultural; social e interior.
Entendemos ser necessário construir um paralelo do pensamento de Hegel e sua Fenomenologia do Espírito: A diferença do lugar é uma diferença essencial entre o positivo e o negativo, de forma que o positivo é a referência idêntica ao lugar, de tal modo que não é o negativo, e este é de tal modo um diverso do lugar que não é o positivo. Visto que cada lugar é para o lugar enquanto não é o espaço, cada lugar aparece no espaço e só o é enquanto é o espaço.
Pode parecer confuso, mas não tanto: cada um é para o lugar enquanto não é o espaço e mesmo quando se representa no espaço só é o espaço enquanto essa representação durar, o que nos afasta da conclusão acima baseada em Deleuze, mas apenas porque esta refere o processo já na sua fase seguinte, ou seja, quando o espaço do ser se desmultiplica em vários espaços do ser segundo as representações em campos diferentes ou diferenciados. Estamos sempre no campo da interioridade e da intimidade do lugar e a única coisa que aparece é o espaço do ser representado no ser.
O que nos preocupa, neste momento, não é a existência temporal ou temporária de um espaço que é um lugar interiorizado de forma distinta, mas sim as implicações que a aceitação de uma subsunção poderia trazer para uma análise correta da poética e da personalidade do lugar. O espaço pode ser espaço se de alguma forma se "emancipar" do lugar e essa emancipação liga-se a uma subsunção no mesmo sentido que Hegel e Marx referem na sua dialética do senhor e do escravo que é um processo histórico e não intimista, como se entenderá.
Tal subsunção leva à desidentificação e coloca o indivíduo nos braços da sociedade integrando-o como ser social emergindo num todo igualmente geral. Não é esse o caso do lugar que se mantém ele mesmo e que não joga em planos desidentificativos. O fato do próprio lugar apresentar-se quase até à exaustão de não saber e/ou não ter consciência do que é, elimina qualquer hipótese de desidentificação. Não se pode perder aquilo que se não tem ou com o que não se identifica. Aliás toda a poesia e a prosa do lugar são constituídas por manifestações do próprio lugar.
O problema do lugar e do espaço só se apresenta e só se evolui aqui porque reparamos nesta conceituação e porque julgamos importante realçar este aspecto. O espaço do ser não resulta da confrontação/comparação com o espaço em abstrato, mas resulta sim de um processo interiorizado, no qual o espaço comparativo está sem dúvida remotamente presente, mas que sublima a fase da necessária confrontação/comparação para se produzir e replicar dentro do lugar de ser.
Não termina aqui.
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