quarta-feira, 26 de maio de 2010

Reflexão: Revitalização

O que nos interessa é realçar o aspecto deste logos, a forma fechada dos planos de revitalização e como o são construídos, através da exploração de campos temáticos por um lado e pela introdução de uma sutil forma de diálogo íntimo entre o lugar e o espaço, o que já entra dentro do campo estético da percepção, através da introdução de um espaço dialogante.
Como o conseguem? A revitalização é, sobretudo, um plano temático em que a novidade se impõe. Antes de mais nada é criação de uma figura dupla. Essa figura, sem atingir o estatuto do heterônimo lugar/espaço, inscreve-se dentro do mesmo lócus fenomenológico, ou seja, reflete a crise do lugar – e da sua sinceridade poética – pela obrigatória constatação, perfeitamente moderna, de que a única forma que se tem de conseguir afirmar a sua subjetividade é anular o lugar e projetar o espaço.
Aqui nos interessa sublinhar dois pontos; o que reflete às observações entre o conteúdo do lugar e a forma enriquecida dentro do lugar/espaço. Ora, é de se entender, que o campo temático não se relaciona com a estética interior do lugar de forma a determinar, através de uma conjunção refletiva, a avaliação dessa mesma estética. Qualquer que seja o campo temático que se enquadre e que se ajuste, mantendo-se a forma como plástica do belo, o enriquecimento acontece.
Ainda, e por outro lado, não existe qualquer anulação do lugar através da introdução do espaço. Importa esclarecer este aspecto porquanto a anulação/aniquilação do lugar de ser enquanto ser está fora de causa; trata-se do ser do lugar, ou seja da substância do lugar, e qualquer conceito de anulação só pode entrar no campo em que a anulação do lugar implica sua entrega perante a predominância do espaço ou dos espaços como ser antropológico, ou ser inserido num processo que já não é do lugar em si mas do espaço em si.
Confusão esta que parece ser partilhada, como veremos. Uma coisa é, e será sempre, o lugar de ser e o espaço como ser, enquanto o espaço do ser e o espaço como coisa totalmente distinta. Será o espaço, enquanto espaço, pelo fato de ser originalmente outro lugar de ser e continuar, cada vez mais remotamente se afastar do lugar de ser inicial ou do lugar de partida, passando a conter já não o substante, mas sim as replicações sucessivas e de qualidades diferentes do lugar dentro do espaço?
O lugar e o espaço são, ao meu ver, perfeitamente compatíveis como entidades distintas sem subsunção de um pelo outro. Enquanto a possibilidade de o espaço ser o projecto conscientemente sonhado ou expressamente admitido, o problema coloca-se na mesma relação de complementaridade fundida e nunca de oposição. Compreendemos a dificuldade de se admitir a possibilidade destes lócus se seguirem um ao outro sem que isso implique substituição ou diferenciação de um pelo outro, abrindo desta forma caminho à heteronomia, ainda tão mal digerida pelo ideário nacional, e ao qual a entrada no "fingimento" não é alheia. Por esta lógica, como um lugar não pode ser dois lugares, um deles não é um lugar.
Procura-se assim, fazer do lugar um fingidor por excelência e trazê-lo aos domínios da transcendência e colocá-lo na mera posição de surrealista. Ora não se pode entender o lugar assim, é preciso vivê-lo com muita seriedade e convicção e utiliza-lo como bálsamo psicológico e terapêutico. Podemos colocar o lugar como problema, mas nunca fingir que o  problema não exista.
Sobre esta questão da subsunção do lugar pelo espaço e dos limiares difusos para a heteronomia, existe abundante literatura que é importante rever, até porque a questão se encontra na ordem do dia nestes momentos de massificação dos campos temáticos. Como ilustrações vejam o valor argumentativo do trabalho secular de Boécio; “como a Trindade é um Deus e não três deuses”. Deus não difere de Deus a título algum, pois não há diversidade de sujeitos por diferenças acidentais ou substanciais, pois, onde não há diferença, não há pluralidade alguma, e daí tampouco número, mas somente unidade. E quando dizemos três vezes Deus e dizemos Pai, Filho e Espírito Santo, estas três unidades não fazem pluralidade numérica naquilo que elas mesmas são, se consideramos a própria realidade numerada e não o modo pelo qual numeramos. Neste caso, a repetição de unidades produz pluralidade numérica; quando, porém, se trata da consideração da realidade numerada, a repetição da unidade e o uso plural não produzem de modo algum diferença numérica nas realidades.
Não termina aqui.

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